domingo

A LENDA DA CHUVA


Imagem de Sóter França Jr e André Lathan

Poesia de Andrea A. Ferrassoli


Jamais ouvida por aqui

É a história que vou contar

Nem é fácil admitir

O que não se pode esperar

Havia muito profundo

Um grande vazio a esmo

Antes deste mundo

Ser mais mundo dele mesmo

Dia e noite, noite e dia

Sol, Lua e nada mais

E o que ninguém podia

Era ver os animais

Não tinha bicho, planta, flor

Chuva? Jamais se viu!

Como se falava de amor

Nestas terras do Brasil?

Suas vidas viviam os homens

Entre rios e montanhas

Mesmo os velhos e os jovens,

De ignorância tamanha

Peixes eram realmente

Bom e rico alimento

Daquela rude e forte gente

Sempre o único sustento

Para fugir desse destino

Tão malfadado e cruel

Os peixes então fugiram

Para os rios lá do céu

É verdade o que conto

Num lindo dia de verão

Os peixes foram ao encontro

Das nuvens feitas de algodão

Nenhum peixe suportava

Ser alimento a cada dia

Do homem que os matava

Pois outro animal não havia

Quando no céu chegaram

Os peixes então livremente

De nuvem em nuvem pularam

uma alegria permanente

Os rios do céu recebiam

Os peixes que da terra chegavam

Que a cada hora subiam

E os homens abandonavam

Com o passar do tempo

Sofria a humanidade

Sentiam a todo momento

Fome, tédio e saudade

Peixes não mais existiam

Em quaisquer rios da Terra

Os homens então morriam

Como em tempos de guerra

Silenciaram a folia

Os peixes do céu comovidos

A humanidade sofria

Tempos tristes jamais vividos

Num grande momento de dor

Todos os peixes do céu

Choraram comovidos de amor

Pelos homens jogados ao “léu”

Os peixes choraram tanto

Que as nuvens do céu incharam

Não mais seguraram o pranto

E as águas então vazaram

Transbordaram as águas do céu

E caíram a todo instante

Primeiro em forma de véu

Depois num gostoso “pingante”

Houve então muita alegria

O que ninguém esperava

De repente assim surgia

A primeira chuvarada

Os peixes arrependidos

Suas lágrimas choraram

Com a chuva de amor amigo

A natureza recriaram

Água mole em rocha madura

Tanto bateu que desmanchou

Sabe a pedra que era dura?

Em terra boa se transformou

E desta terra germinaram

Plantas para dar comida

Aos homens que acreditaram

Neste milagre da vida

Da terra sentiram saudades

Os peixes dos rios do alto

E de sua própria vontade

Voltaram sem sobressalto

Os que de lá saltitantes

Fora dos rios caíam

Viravam a todo instante

Outros bichos sabiam?

Desse modo que sabemos

Como surgiram então

Os bichos que conhecemos

Tucano, onça e mico-leão

Os homens agora de verdade

Uma lição aprenderam

Só caçariam pela necessidade

Pois todos quase morreram

Aos humanos foi entregue

Pelo Pai Celestial

Toda planta, pedra, vento

Todo e qualquer animal

Para que deles tirassem

A comida para seu viver

E a natureza respeitassem

Assim como havia de ser

O bicho, o homem matava

Quando a tal fome batia

E a barriga apertava

A Lei Divina assim dizia

Lição aprendida foi o respeito

Do homem pela natureza

E este então grande feito

É visto com muita pureza

E por todos nós este exemplo

Deve ser sempre imitado

O homem tendo a todo tempo

Com a planta e com o bicho muito cuidado

O homem da terra cuidando

De geração em geração

E a terra ao homem dando

Beleza e alimentação

Foi um tratado de amor

Que a chuva então uniu

A natureza e os homens

Nestas terras do Brasil.


Um dia, navegando pela internet, encontrei fragmentos de uma lenda brasileira sobre a primeira chuvarada no Brasil. Pesquisando mais, descobri que esse conto pertence aos MAXACALI – Nação indígena que vive no Vale do Mucuri, no nordeste do estado de Minas Gerais. Essa Nação ainda preserva sua língua, seus costumes e as tradições de seus antepassados, mas convivem também com outras comunidades indígenas e não indígenas. Possuem muitas lendas, histórias, canções e já há inclusive, publicações destas.

Tantas coisas assim, me inspiraram a recontar a Lenda da Chuva através de versos e contornos da minha imaginação.

Desse conto poético nasceu um espetáculo teatral chamado “Você quer Brasil e Arte? Temos por toda a parte!”, composto também de outras histórias populares que rodou espaços diversificados do Rio de Janeiro. A peça foi dirigida por Sóter França Jr. que transformou verso e prosa em cenas recheadas de sons, movimentos e cores. Foi encenada por muitos atores e hoje, compõe o acervo da Oficina Parangolé.

O sucesso dessa lenda em especial, nos fez pensar em eternizá-la nas páginas de um livro que está sendo cuidadosamente preparado. Junto a André Latham, vimos nosso sonho aos poucos tornar-se realidade.

Essa lenda traz uma reflexão sobre um tratado de amor entre homem e natureza, tão desejado por todos nós.

Andrea A. Ferrassoli

Um comentário:

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